23 de maio de 2014

A Filha do Louco (Megan Shepherd) | The Madman's Daughter, livro #1

 Ambientado na Londres do século XIX, A filha do louco, de Megan Shepherd, apresenta o leitor à Juliet Moreau, uma jovem de 16 anos que, após um escândalo envolvendo seu pai - o famoso e importante Dr. Moreau -, teve a sua vida alterada completamente. Após graves acusações, o Dr. Moreau perdeu o direito de exercer a medicina e desapareceu, deixando para trás sua esposa e a pequena Juliet que, na época, tinha apenas dez anos.

Seis anos depois, Juliet é uma órfã sem dinheiro algum e que sobrevive como faxineira e arrumadeira de um laboratório da faculdade de medicina. Em meio a muitas humilhações - incluindo assédio sexual e tentativas de estupro -, Juliet tenta esquecer os rumores acerca de seu pai e das possíveis atrocidades que ele possa ter cometido, ao mesmo tempo em que demonstra bastante interesse e conhecimento em medicina.

Quando a sua vida parece ter atingido um ponto sem esperança alguma, ela acidentalmente reencontra Montgomery, um rapaz de 18 anos que costumava trabalhar como assistente de seu pai. Intrigada com súbito aparecimento de Montgomery e seu estranho criado e, mais ainda, com um mapa anatômico que apareceu na faculdade de medicina, Juliet resolve investigar; e descobre que o Dr. Moreau ainda vive e está exilado em uma ilha tropical bastante remota e exótica, onde realiza estranhas experiências.

Cheia de dúvida, curiosidade e certeza de que nada tem em Londres, Juliet resolve embarcar junto com Montgomery em um barco rumo à ilha em que seu pai vive. No meio da viagem, a tripulação encontra Edward, um náufrago à beira da morte que acaba sendo resgatado e levado para a ilha também.

***

Antes de contar o que achei, é preciso mencionar que A filha do louco é o primeiro livro de uma trilogia que pretende dialogar com três clássicos da ficção-científica: A ilha do Dr. Moreau, de H.G. Wells; O médico e o monstro, de Robert L. Stevenson; e Frankenstein, de Mary Shelley.

No primeiro volume, Megan Shepherd dialoga com o livro de H.G. Wells e nos apresenta os mesmos - ou quase isso - personagens, porém com algumas sutis diferenças. A ideia é bastante criativa e a história é bastante envolvente. Durante toda a narrativa, a autora conseguiu criar uma atmosfera de mistério e suspense, ao mesmo tempo em que realizou ótimas descrições de ambientes. O leitor se sente, de fato, dentro da ilha.

Porém, tenho algumas ressalvas a fazer. Ainda que tenha gostado das descrições de ambiente, acho que a autora pecou muito nas descrições de cenas, que tornam a narrativa meio enrolada. Durante toda a leitura, o leitor depara com coisas do tipo:

[diálogo simulado]
- Você gostaria de tomar chá? - Ele me perguntou enquanto segurava o bule e apontava para a xícara com o olhar.
- Sim, eu adoraria. - Respondi enquanto o observava colocar o chá em minha xícara e depois entregando-a em minhas mãos. A água fervia, assoprei, na esperança de que esfriasse.

Não me lembro de um diálogo exatamente assim, mas o que quis mostrar é que, nessa história, descrições de cenas assim são completamente desnecessárias, pois não parecem acrescentar nada. Seria muito mais prático se autora simplesmente dissesse que os personagens estavam tomando chá, oras. Quando isso ocorre uma vez não incomoda; o problema é que lá pela metade do livro, tudo fica meio monótono e a narrativa fica marcada por ações triviais como olhar pela janela e beber uma xícara de chá; todas detalhadas nos mínimos detalhes, como se o leitor não soubesse como é que as pessoas bebem chá.

Outro ponto sobre a narrativa que merece atenção é o fato de que ela é realizada em primeira pessoa por Juliet. Eu, particularmente, não me incomodo muito com narrativas em primeira pessoa...exceto quando estamos falando de um livro YA com protagonista feminina. E aqui, mais uma vez, o leitor é forçado a acompanhar os pensamentos chatos e completamente incoerentes de uma personagem adolescente. Então, sim, Juliet, a princípio se mostra uma jovem bastante independente e capaz de sobreviver sozinha às crueldades de uma cidade como Londres, porém, é só ela chegar na ilha que muda completamente e se transforma em uma garota frágil que passa a maior parte do tempo pensando em rapazes.

O que me leva a mais um ponto negativo: o triângulo amoroso. Não que o triângulo fosse completamente incoerente; muito pelo contrário, até que fez sentido, se considerarmos o contexto da história. Porém, quando estou lendo sobre uma ilha exótica habitada por um médico estranho que pratica experiências bizarras, a última coisa que quero é acompanhar os "mimimis" de uma adolescente que parece viver em função de seus hormônios. Tudo bem ela ficar em dúvida, afinal está descobrindo seus sentimentos; o problema é que não dá para levar a protagonista à sério em boa parte do livro. Imagine você na selva, no meio da noite, fugindo de um monstro. O que você faria? Eu tentaria me esconder e salvar a minha vida. Juliet prefere ficar parada e olhar para os músculos do boy. Quer dizer, é tudo uma questão de prioridades, né? 

Ainda assim, com todos esses aspectos que me incomodaram profundamente, gostei da história. Acho que é preciso levar em consideração o fato de que este foi o primeiro livro da autora e relevar algumas coisas. Como ando numa fase sem paciência para séries/trilogias YA, é possível que tenha me irritado mais do que o normal. E o final do livro foi realmente muito legal e inesperado: com plot twist e cliffhanger, o que me deixou bastante motivada a continuar a série. O segundo livro já foi publicado lá fora, mas ainda não soube de nada a respeito da publicação aqui no Brasil.

Ah, e vale também mencionar que o livro faz referência a várias peças de Shakespeare. Consigo me lembrar de cinco: A TempestadeNoite de ReisEduardo IIISonho de uma noite de verão e Júlio César.

Para concluir o texto, digo que pretendo continuar com a trilogia e que a recomendo (pelo menos o primeiro livro) àqueles que se interessaram pela trama, que gostam de aventuras com um quê de suspense e terror e que não se incomodam com clichês de romances adolescentes.

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