17 de agosto de 2015

O sol é para todos (Harper Lee)

 A primeira vez que ouvi falar de O sol é para todos foi em 2012 e desde então, fiquei com aquela sensação de que este era um livro obrigatório, daqueles que tinha que ler antes de morrer porque iria mudar a minha vida. Adiei a leitura na espera de um “momento certo” e ele chegou três anos depois, com o lançamento de uma nova edição pelo selo José Olympio, da editora Record.

O sol é para todos, romance de formação escrito por Harper Lee, foi publicado em 1960 e desde então tem conquistado gerações de leitores ao redor do mundo. Vendedor do Pulitzer e considerado um clássico moderno, o livro aborda questões que, mais de cinquenta anos após a sua publicação, se mantém atuais: racismo, desigualdade social e injustiça.

Pela da narrativa de Scout Finch, uma criança questionadora e de personalidade forte, Harper Lee, apresenta o leitor à Maycomb (Alabama) e à realidade do sul dos Estados Unidos na década de 1930. O livro é dividido em duas partes e tem início no verão em que Scout tinha apenas sete anos e estava ansiosa para iniciar a sua vida escolar. Na companhia de Jem e Dill – seu irmão mais velho e melhor amigo, respectivamente – a menina passa os dias ensolarados planejando travessuras, bem no estilo de Tom Sawyer, no clássico de Mark Twain. 

É também logo no início que a autora introduz Atticus Finch, pai de Jem e Scout, um advogado que se mostra a bússola moral de Maycomb. Viúvo, ele conta com a ajuda de Calpúrnia - uma mulher negra que é sua cozinheira e governanta-, para a criação de seus filhos, fazendo o possível para que eles aprendam a desenvolver o pensamento crítico e saibam distinguir o certo do errado. Atticus é um homem justo e respeitado a quem todos recorrem quando precisam de ajuda, e é por meio de seu trabalho que Scout e Jem irão perceber o quão problemática é a comunidade em que vivem.

"Em primeiro lugar, Scout, se aprender um truque simples, vai se relacionar melhor com todo tipo de gente. Você só consegue entender uma pessoa de verdade quando vê as coisas do ponto de vista dela." (P. 43)

A segunda parte do romance inicia quando Atticus precisa defender um homem negro acusado de estuprar uma mulher branca. A notícia revolta parte da população local e sua família passa a lidar com as consequências deste fato. Através do olhar puro de Scout somos apresentados ao racismo enraizado em Maycomb. Tom Robinson é inocente, mas é negro e para a maioria dos membros daquela comunidade este fator já é suficiente para lhe condenar sem provas ou julgamento. 

"Queria que você a conhecesse um pouco, soubesse o que é a verdadeira coragem, em vez de pensar que coragem é um homem com uma arma na mão. Coragem é fazer uma coisa mesmo estando derrotado antes de começar. E mesmo assim ir até o fim, apesar de tudo". (P. 143) 

A partir deste ponto, a história abandona aquele aspecto lúdico do começo e assume um tom sombrio, marcado pela perda da inocência das crianças Finch, que passam a enxergar o mundo como ele realmente é, tanto por perceberem a segregação e indiferença que há naquela comunidade, quanto por se tornarem eles também alvo da intolerância dos moradores de Maycomb. É revoltante para Scout – e para o leitor – perceber o quão hipócritas são os seus vizinhos.

Antes de ler O sol é para todos, fui levada a crer que a obra tratava apenas da questão racial, mas Harper Lee vai além e levanta outras questões importantes, como a desigualdade social e de gênero – que aparece de forma mais sutil - e a importância da educação. Com o julgamento de Tom Robinson, a defesa feita por Atticus – que defende que todo homem é igual perante a lei - e o desfecho do caso, o leitor passa a questionar o conceito de justiça e até que ponto ela se faz real.

"Mas antes de ser obrigado a viver com os outros, tenho de conviver comigo mesmo. A única coisa que não deve se curvar ao julgamento da maioria é a consciência de um homem". (P. 135) 

A leitura, apesar de tratar de temas fortes e densos, flui bem e acredito que isso ocorra por se tratar da perspectiva de uma criança (ainda que a narrativa seja feita quando Scout já é adulta, recordando os acontecimentos de sua infância). Ao mesmo tempo em que há doçura e leveza no texto, há também algo de muito doloroso e assustador. Mais triste é perceber o quanto esta história ainda se faz necessária e atual. 

Ao fechar o livro, fiquei com uma sensação amarga, sem saber se achei o livro lindo ou aterrador, pessimista e sem esperança. Há, definitivamente, algo de melancólico e contraditório em tudo e fiquei com a sensação de que a principal mensagem que Harper Lee quis passar é a da tolerância. Por fim, também não sei dizer até que ponto esta leitura me marcou, mas estou feliz por finalmente tê-la realizado. É uma leitura válida, sem sombra de dúvidas, e que recomendo.

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