6 de março de 2015

Alta Fidelidade (Nick Hornby)

(...) O que vem antes, a música ou o sofrimento? Eu ouvia música porque sofria? Ou sofria porque ouvia música? Será que aqueles discos todos é que me deixavam melancólico? (p.30)
Ambientado na Londres dos anos 1990, Alta Fidelidade, de Nick Hornby, traz a história de Rob, um cara de 35 anos que trabalha em uma loja de CDs, da qual também é dono. Após o fim de seu longo relacionamento com Laura, Rob tenta superar o ocorrido listando os cinco piores términos de namoro de toda a sua vida – começando pela primeira namorada, que conheceu nos tempos de colégio, até chegar às relações da fase adulta.

Ele é completamente obcecado por música, e passa a maior parte do seu tempo consumindo álbuns de seus artistas preferidos, adquirindo vinis novos e raros para a sua coleção e gravando mixtapes. Basicamente, sua existência se resume a abrir e fechar a loja e, entre essas funções, passar horas e mais horas na companhia de Dick e Barry – os funcionários da loja, de quem não gosta muito – conversando sobre música, insultando clientes que, aparentemente, não tem tanto conhecimento sobre o assunto e sofrendo por causa de Laura. Assim como Rob, Dick e Barry não tem uma vida além da loja.

Por meio de uma narrativa em primeira pessoa, Rob tenta nos convencer – no caso, convencer sua ex – de que o fim do namoro com Laura não foi, nem de longe, o mais humilhante de sua vida. Assim, por meio de seu TOP 5, nos transporta aos diferentes períodos de sua história, nos apresentando suas antigas namoradas e explicando as circunstâncias em que tais relacionamentos chegaram ao fim; tudo acompanhado de uma lista de músicas que marcaram aqueles momentos. Ao falar sobre esses relacionamentos, Rob deixa claro o impacto que cada um teve em seu futuro e tenta compreender o que aconteceu entre ele e Laura para que chegassem ao ponto em que chegaram. 

Com essa premissa, Nick Hornby, com uma escrita fluída e envolvente, apresenta o leitor a um drama sobre relacionamentos na modernidade que se transformou, segundo o The Guardian, em um clássico imediato. Apesar de ambientado 20 anos atrás, o enredo e os temas abordados em “Alta Fidelidade” permanecem atuais. Por meio da história de Rob, o autor trata de alguns dos problemas mais comuns ao ser humano do século XXI: o medo de relacionamentos e de confiar em outra pessoa, a dificuldade para amadurecer e o excesso de egoísmo e egocentrismo.

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No fundo, o livro é um monólogo, no qual o protagonista tenta se encontrar, se fazendo de vítima e culpando suas ex-namoradas pela vida frustrante que leva. Rob é desagradável, pedante e imaturo e isso transparece em sua narrativa, de forma que o leitor consegue enxergar como ele é, mas ele não. Ele é uma pessoa superficial, que julga as outras tendo como base interesses e conhecimentos musicais, e se estes não estiverem de acordo com o que ele julga interessante, a pessoa se torna descartável. Ele não está pronto para um relacionamento sério, mas ao invés de assumir isso, prefere por a culpa na ex, dizendo que ela gostava de bandas que para ele eram intragáveis, e não aceitando que ela saia à procura de alguém que espera o mesmo que ela em um relacionamento.

Mas aquilo ali continha uma verdade séria e essencial, a de que essas coisas importam mesmo, portanto não é legal fingir que uma relação tem futuro quando as coleções de disco divergem violentamente, o quando os filmes preferidos de cada um nem conversariam caso se encontrassem em uma festa. (p. 117)

Mesmo sem simpatizar com Rob, não pude evitar sentir alguma identificação com algumas das coisas que ele diz, principalmente em relação a suas impressões sobre a música em geral e o poder que ela tem de modificar o nosso humor e nos trazer esperança em momentos em que tudo parece perdido. Gostei também de sua sinceridade em relação a algumas normas do comportamento social que, para ele, não fazem o menor sentido. Muitas vezes ele fala algumas coisas que podem incomodar, mas, quando paramos para pensar percebemos que não são tão absurdas e a gente até já pensou nelas, mas nunca as tornamos públicas.

Talvez vivamos, todos nós que passamos os dias absorvendo material emocional, num estado de alta intensidade, e consequentemente jamais consigamos estar simplesmente contentes: precisamos estar infelizes, ou absurda e apaixonadamente felizes, e esses são estados difíceis de se obter numa relação sólida e estável. (p. 166)

Por fim, “Alta Fidelidade” é um livro interessante, de fácil leitura, que proporciona algumas reflexões nas entrelinhas e está recheado de referências musicais. Gostei bastante da escrita de Nick Hornby e, com certeza, pretendo ter mais contato com seu trabalho. Leitura recomendada!

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