21 de setembro de 2018

O canto mais escuro da floresta (Holly Black)

Descobri O canto mais escuro da floresta enquanto procurava algo que despertasse o meu interesse no catálogo do Kindle Unlimited e, sem muitos critérios além de achar a capa bonita, resolvi arriscar a leitura. E ainda bem que o fiz, porque a experiência acabou se revelando uma das minhas preferidas do ano. Até então, meu único contato com o trabalho de Holly Black havia sido o conto Krampuslauf, um dos meus preferidos da coletânea O presente do meu grande amor, e não demorei muito para perceber certa familiaridade na narrativa, cheia de bom humor e personalidade.

Sem sombra de dúvidas, depois da capa bonita, a primeira característica que me atraiu foi o fato de a autora explorar a mitologia de fadas. Sinceramente, acho que nunca havia lido algo com essa temática, então tudo me pareceu interessante e, ao mesmo tempo, confuso. Aliás, acho válido mencionar que a autora não dedica muito tempo para explicações; sua história acontece em uma cidade em que fadas convivem com humanos, pregando todos os tipos de peças, e todo mundo parece estar bem tranquilo em relação a isso, de forma que o leitor deve simplesmente aceitar essa realidade e não questionar muito as estruturas do universo da história. Basta saber que o povo das fadas vive na floresta próxima da cidade e que, de forma geral, não causa muitos desconfortos para os habitantes. O mesmo não pode ser dito em relação aos turistas.

Há também o mistério do garoto que dorme no esquife no meio da floresta, o que acaba por deixar a história toda com um ar de contos de fadas moderno, porém do tipo que subverte alguns clichês e também é muito mais sombrio do que aqueles que costumávamos ler quando éramos crianças. O que mais gostei em relação ao garoto adormecido é que, enquanto nas histórias infantis a pessoa que dorme só desperta no final, aqui o despertar surge como um "chamado para a aventura", pois é justamente a partir deste momento que Hazel acaba se envolvendo em uma trama cheia de reviravoltas. A narrativa, como disse, é divertida e bastante fluída e Holly Black sabe como conduzir a história de um jeito que prende o leitor do começo ao fim. Ao mesmo tempo em que há linearidade, a autora parece esconder alguns elementos relacionados ao passado dos personagens e só os revela no momento oportuno, criando vários plot twists que me pegaram de surpresa.

Os personagens também são um ponto muito positivo; talvez o mais positivo, na minha opinião. Hazel é engraçada e bastante determinada. Há momentos em que realmente não sabemos o que esperar de suas atitudes e digo isso de um jeito positivo, porque ela é capaz de fazer qualquer coisa se isso significar que aqueles com quem se importa estarão salvos (também achei ótimo que ela não consegue se controlar e sai beijando todo mundo - juro que faz sentido no livro!). Ben, seu irmão, pode parecer mais avoado, mas logo percebemos que ele também é uma caixinha cheia de surpresas - meio inseguro, é verdade, mas sempre disposto a ajudar. Tem também o Jack, melhor amigo de Ben e interesse romântico de Hazel, e confesso que demorei um pouco para ter uma opinião formada a seu respeito e até para entender qual era a dele. Ele é aquele tipo de personagem do qual a gente desconfia (e temos um ótimo motivo para isso também, viu?). Por fim, mas jamais menos importante: Severin, meu personagem preferido do livro todo. Não dá para falar muita coisa sobre ele, pois poderia revelar muito da história; contudo, basta saber que ele é um personagem diferente do que eu esperava, possui um ótimo senso de humor e eu adoraria tê-lo como amigo.
Somos todos suscetíveis ao autoengano quando este nos é favorável.
A única forma de acabar com a tristeza era passando por ela.

De forma geral, adorei a leitura de O canto mais escuro da floresta e tenho apenas duas ressalvas. A primeira delas é em relação ao relacionamento de Hazel e Ben com seus pais. Existem muitas questões não resolvidas entre eles e o livro chega ao fim sem explorar esses aspectos, de forma que ficou parecendo algo meio jogado na história sem muito propósito. A autora chega a apresentar algumas explicações, mas não achei muito satisfatório. A outra ressalva diz respeito ao desfecho, que aconteceu, a meu ver, muito rápido. Não é algo que tenha atrapalhado a compreensão do que estava acontecendo, mas acho que algumas páginas a mais teriam funcionado melhor. O vilão também não me pareceu muito ameaçador e achei um pouco caricato (algo meio "sou mal apenas por ser mal", sabem?), mas como a ideia era contar uma história com ares de contos de fadas, acho que deu certo e não me incomodou. Leitura recomendada!