Sobre o que é?
Memórias da Princesa: os diários de Carrie Fisher tem um título quase autoexplicativo, pois trata dos diários que a atriz escreveu durante o período em que estava gravando o primeiro filme da franquia Star Wars, em 1976, quando tinha 19 anos. Logo no início, Carrie já avisa que não tem certeza sobre todos os fatos registrados nos diários, tanto por conta da passagem do tempo, quanto pela quantidade de álcool e drogas que consumiu na época. Com o intuito de contextualizar e de apresentar ao leitor que talvez não saiba quem ela é, Carrie discorre um pouco sobre sua família e criação pouco convencionais - ela era filha de Debbie Reynolds e Eddie Fisher, astros da Era de Ouro de Hollywood -, tendo os holofotes como parte de sua vida desde muito pequena e como lidar com isso sempre foi muito difícil, já que ela não gostava da exposição decorrente da fama. O escândalo envolvendo o divórcio bastante público de seus pais também é um assunto no qual ela toca, deixando claro que não tinha uma boa relação com ambos, principalmente seu pai.
Sem sombra de dúvidas, o destaque maior fica para os trechos em que ela fala sobre o breve romance que manteve com Harrison Ford - fato que até então, não havia sido revelado -, casado na época e muitos anos mais velho. Ela chega, inclusive, a recordar que o relacionamento era tão perturbador que foi a principal razão para que mantivesse os diários, que funcionavam como uma válvula de escape para toda a loucura que estava acontecendo em sua vida.
O que eu mais gostei?
Com certeza, a oportunidade de saber um pouco mais sobre Carrie a partir de informações que a mesma decidiu compartilhar. Apesar de o foco principal ficar por conta dos diários, ela dedica uma parte considerável do livro à comentários sobre sua infância e sua adolescência e, claro, sobre o momento em que virou a Princesa Leia, discorrendo sobre os testes, convívio com elenco e produção dentro e fora das telas, a pressão para adequar o seu peso ao padrão de beleza exigido, a fetichização de Leia e a relação com os fãs (ela era muito agradecida por todo o amor e o carinho e adorava tudo isso, mas se incomodava porque muitas vezes alguns fãs passavam dos limites e se esqueciam que ela era um ser humano e não apenas uma bela princesa em uma aventura espacial).
O tom de humor bastante autodepreciativo e debochado também é um aspecto positivo do livro. Por trás de todas as brincadeiras e piadas, fica muito claro que Carrie não apenas está contando uma história sobre o seu passado, mas também criticando a postura de homens da indústria que cruzaram o seu caminho e que reflete na postura, de forma geral, do público. É triste perceber que por trás da forte Princesa Leia, estava uma menina de 19 anos completamente perdida, assustada, negligenciada e da qual muita gente se aproveitou (cabe aqui mencionar o biquíni que ela teve que vestir na cena em que vira escrava do Jabba em O Retorno de Jedi). Pior ainda é perceber que, com o passar dos anos e seu natural envelhecimento, tenha "desaparecido"; apenas para voltar a ser lembrada quando passou a ser "interessante novamente" quarenta anos depois, quando um novo filme de Star Wars passou a ser produzido. Aqui passamos a refletir também sobre o quanto Hollywood e a indústria do entretenimento é cruel com pessoas que começam a envelhecer, principalmente mulheres.
Outro ponto que chamou a minha atenção foi a relação de Carrie com sua mãe. Pelos comentários, é possível perceber como foi difícil para ela crescer sendo filha de uma atriz famosa e vivendo nos bastidores de seus espetáculos - ela chegou, inclusive, a fazer backing vocal nos shows de Debbie quando era adolescente. Ainda que ela não diga com todas as letras, dá para perceber que há algum ressentimento de Carrie em relação à mãe, que pareceu priorizar o show business acima de tudo e que nunca foi uma mãe "normal", do tipo que a proibisse de fazer coisas, por exemplo, mas que fizesse propostas muito esquisitas, como assistir a filha fazer sexo para poder dar umas dicas de como se comportar nesse tipo de situação.
O que pode ser motivo para não gostar?
Os diários propriamente ditos, que não ocupam a maior parte do livro, apesar do título. Acontece que aqui temos uma mistura de livro de memórias escrito por Carrie pouco antes de começar a gravar O Despertar da Força e os diários que manteve em 1976. E os trechos dos mesmos consistem em poemas, frases desconexas, trechos de músicas e algumas entradas que fazem mais sentido. É exatamente o que se espera de um diário, mas que pode ficar um pouco cansativo depois de um tempo, já que é bastante repetitivo.
Recomendo para quem?
Fãs de Star Wars, fãs de Carrie Fisher e pessoas interessadas em memórias de personalidades do cinema.
Considerações finais
Senti que parte do estilo de Carrie se perdeu na tradução o que fez a leitura soar um pouco travada. Se possível, opte pelo texto original.
"No entanto, a principal coisa que você percebe sobre a Leia de cera é que ela está quase nua. (...) Todos os outros foram vestidos com as roupas convencionais do primeiro filme. Eu tive que usar a roupa que Jabba escolheu para mim. Jabba the hutt, o fashionista. Jabba the hutt, o Coco Chanel do estilo intergaláctico. Lança tendências, se dedica à moda, lidera os looks femininos no seu mundo, no seu planeta e outros. Na cera, sempre vou estar com a roupa escolhida pelo bandido Jabba. Na cera e sem cera, sempre vou estar com cara de chapada".