26 de novembro de 2014

Silo (Hugh Howey)

Em 2011, Hugh Howey publicou um conto de forma independente pelo sistema Kindle Direct Publishing, da Amazon. Após o sucesso repentino da publicação e dos pedidos de leitores, ele decidiu expandir a sua história com mais quatro contos que, posteriormente, foram unidos como um único livro chamado Silo, que se tornou um best-seller, teve seus direitos comprados pelos estúdios 20th Century Fox e chegou às livrarias brasileiras em 2014, pela editora Intrínseca.

Silo nos apresenta a um futuro distópico e pós-apocalíptico em que, após guerras e destruição, a superfície terrestre se tornou tóxica e cheia de radiação, forçando os seres humanos a viverem embaixo da terra em uma estrutura semelhante a um silo (recipientes utilizados para o armazenamento de sementes e outros produtos agrícolas). Enclausurados, aqueles que vivem lá dentro estabeleceram uma nova sociedade, onde todos tem uma função e não devem questionar o sistema. Aqueles que comentem crimes ou demonstram o desejo de sair do silo são condenados e mandados para fora, onde morrem em poucos minutos. Suas mortes são captadas por câmeras externas e seus corpos ficam à deriva, decompondo e visíveis à todos os que estão no silo.

Pouco se sabe da vida antes do silo e das pessoas que viviam na superfície; perguntar sobre o passado pode ser visto como algo errado e levar à limpeza. Ao longo dos anos, o silo sofreu com vários levantes, que sempre foram controlados e seguidos pela paz. No começo da história, temos conhecimento das circunstâncias estranhas da morte de Holson, o xerife do silo. Com motivos para acreditar que algo muito ruim está para acontecer, a prefeita Jahns e o delegado Marns, partem para os níveis mais baixos do silo à procura de Juliette, uma mecânica que creem ser a melhor opção para o cargo de xerife.

Sem compreender o motivo de ser escolhida, mas acreditando poder ajudar seus amigos, Juliette aceita o novo emprego. Após alguns dias, mortes estranhas começam a acontecer e quanto mais ela tenta investigar a situação, mais misteriosas e complicadas as coisas ficam. Tudo piora quando é a vez dela de fazer a limpeza.

Pouco sabia sobre o enredo de Silo quando iniciei a leitura, de forma que cada página foi uma surpresa. Logo no início, acompanhamos as últimas horas de Holston, o xerife do silo, e também somos apresentados a essa sociedade subterrânea e a sua forma de funcionamento. Apesar do ritmo lento e do detalhamento do começo, tudo me soava bastante intrigante e curioso, me fazendo querer continuar com a leitura. Porém, depois da página 100 as coisas se tornaram um pouco conturbadas e inconstantes.

O livro traz uma proposta interessante e que abre margens para discussões sobre política, controle de informação e manipulação de massas, porém, fiquei com a sensação de que a ideia poderia ter sido melhor executada. Sinto que o maior problema com Silo não é a história, mas sim a forma como ela é contada. A narrativa de Hugh Howey é simples e em terceira pessoa, porém extremamente enfadonha na maioria das partes, com descrições em excesso, repetitivas e desnecessárias. É cansativo ter que ler sobre cada movimento feito por um determinado personagem e nos momentos em que seria necessário um maior detalhamento, o autor opta por ser breve e deixa tudo um pouco confuso. Terminei a leitura sem conseguir visualizar muito bem o silo e a limpeza.

Há também a questão do desenvolvimento lento da trama. Juliette é a protagonista e a heroína da história, porém a sua estreia ocorre apenas no fim da segunda parte. Antes disso, o leitor acompanha páginas e mais páginas da jornada da prefeita e do delegado pelas escadas do silo, carregada das já mencionadas descrições enfadonhas. Não que nada de interessante aconteça neste momento da trama, mas é bastante claro que um número menor de caracteres teria sido uma escolha melhor, já que faz com que o leitor perca o interesse pela leitura.

Os personagens são interessantes, mas pouco cativantes. Desde a primeira aparição de cada um deles, já fica claro quem é vilão e quem é mocinho; não há espaço para especulação ou desenvolvimento de camadas. Por conta deste aspecto, suas ações são bastante previsíveis e somadas à narrativa cansativa, resultam mais uma vez em motivos para o leitor não querer continuar com a leitura. Há também um pouco de romance, mas a forma como é introduzido não me convenceu, já que tudo ocorreu meio que abruptamente, com pouco desenvolvimento, de forma que ficou parecendo sem propósito e até meio contraditório.

Sinceramente, meu interesse pelos acontecimentos só voltou a surgir no final da quarta parte, lá pela página 300. A partir deste ponto, a história começa a ficar interessante, com reviravoltas e um ritmo mais agitado. O final é satisfatório, ainda que deixe algumas questões em aberto, principalmente sobre o funcionamento do silo. Porém, por se tratar de uma trilogia, acredito que essas dúvidas deverão ser respondidas nos próximos livros. Ainda que seja a primeira de três partes, Silo traz uma conclusão e fecha um arco, deixando alguns ganchos para o que virá. 

A leitura de Silo, para mim, não foi uma experiência prazerosa, por isso ainda não sei se irei ler suas continuações. Ainda assim, gostei da proposta e acredito que o livro possa agradar a muita gente; uma rápida pesquisa no Skoob e no Goodreads mostra que faço parte de uma minoria. Assim, recomendo que aqueles que tem interesse pelo livro pesquisem outras opiniões antes de decidirem se irão ler ou não. 

25 de novembro de 2014

Minha lista de prioridades (David Menasche)

 Em Minha lista de prioridades - A jornada de um professor em busca das grandes lições da vida somos apresentados a David Menasche, um professor de inglês e literatura do ensino médio (High School) em uma escola preparatória de Miami, que aos 34 anos foi diagnosticado com um tumor no cérebro. De acordo com os médicos que acompanharam o seu caso, a expectativa de vida para David era de poucos meses e, por isso, um tratamento precisaria ser iniciado o quanto antes.

Seguindo à risca o tratamento imposto pelos médicos, David continuou a levar a sua vida de professor da forma mais normal possível e a participar ativamente da formação de seus alunos. Seis anos após o diagnóstico, ele sofreu uma convulsão que lhe tirou parte das memórias, de sua visão e de sua mobilidade e lhe impediu de continuar a lecionar. Ao recordar uma das atividades que realizava com seus alunos, na qual pedia que listassem as suas prioridades na vida, David decide recuperar a sua independência. Ele abandona os tratamentos e parte em uma viagem pelos Estados Unidos, visitando seus ex-alunos, com quem conversa sobre o tempo que viveram juntos na escola.

Primeiramente, gostei do tom leve do livro. Apesar de trazer o relato de um homem que convive com um câncer em estágio terminal, Minha lista de prioridades não é um livro triste, amargo e que te faz ficar com vontade de chorar a cada virada de página. Muito pelo contrário, David Menasche é uma pessoa bastante otimista. Mesmo quando ele tem todos os motivos do mundo para se revoltar com tudo e com todos, ele mantém a cabeça erguida e um sorriso no rosto. Claro que nem sempre foi assim; ele passou por todo o processo de negação até chegar à aceitação. Mas, uma vez que aceitou, ele optou por ser forte e não desistir da luta.

A narrativa é feita em primeira pessoa pelo próprio David, que conta os acontecimentos de sua vida desde quando soube que tinha câncer até alguns meses após a publicação do livro. Ele faz uso de uma certa ironia e também de bom humor em sua escrita, principalmente quando descreve os momentos mais delicados, como, por exemplo, quando teve que contar aos pais sobre a sua situação antes de um jantar de Ação de Graças. O livro também traz os depoimentos de alguns dos alunos de David, normalmente colocados após a descrição de uma situação que tenha relação com o depoimento ou com a relação do professor com seu aluno, que, para mim, constitui o elemento mais bonito do livro. 

É emocionante perceber o quanto um professor é responsável pelas mudanças e decisões na vida de seus estudantes, principalmente quando estes são adolescentes. Dá para perceber pelos relatos que a relação entre David e seus alunos era de muito respeito e confiança; seus alunos, muitas vezes o procuravam para conversar sobre o futuro e os conselhos que recebiam ajudaram a moldar a vida que eles têm hoje. David, mais do que ensinar inglês e literatura, ensinou seus alunos a serem pessoas melhores. A amizade que se formou entre eles foi tão forte que, ao saberem da viagem de David, muitos alunos disponibilizaram suas casas para recebê-lo.

Por ser um professor de literatura, David faz referência à vários livros, principalmente clássicos, da literatura estadunidense e mundial, o que é um prato cheio para quem gosta desse tipo de coisa e está sempre com um caderninho à mão para anotar as dicas. Alguns exemplos: O sol é para todos, O grande Gatsby, O apanhador no campo de centeio, Laranja Mecânica, A revolução dos bichos, A redoma de vidro e On The Road.

O único aspecto que me causou um certo estranhamento é a forma como David descreve a reação de algumas pessoas próximas dele à sua situação; mais precisamente sua esposa (ou, no caso, ex-esposa) Paula. Sempre que o autor deixava claro que havia uma certa indiferença da parte dela, eu duvidava um pouco da extensão de tal comportamento. Atribuo essa reação ao fato de que estamos lidando com uma narrativa em primeira pessoa, que traz as impressões bastante subjetivas de seu narrador. Prefiro acreditar que há um certo rancor da parte de David, do que aceitar seu relato a respeito da esposa como verdadeiro. É cruel demais.

Concluindo, Minha lista de prioridades é um livro otimista, apesar dos motivos que levaram à sua criação, sobre amizade, aceitação e superação. É uma leitura agradável, leve e inspiradora. Recomendo à todos!

12 de novembro de 2014

A noite dos mortos - vivos (John Russo)

Em 1968, John Russo escreveu o roteiro para um filme sobre zumbis que viria a ser dirigido por George Romero. O filme em questão é A noite dos mortos-vivos,  obra em que pela primeira vez os zumbis são retratados como algo assustador e uma verdadeira ameaça para a humanidade. Ao longo das décadas, muitas outras obras viriam a beber na fonte do filme de Romero.

Anos depois, em 1973, John Russo romanceou o roteiro de A noite dos mortos-vivos e também o roteiro de uma possível sequência para o filme que jamais chegou a ser gravada (A volta dos mortos-vivos, que não deve ter seu enredo confundido com a de um filme com o mesmo título dirigido por Dan O'Bannon). A edição lançada em 2014 pela editora DarkSide traz as duas histórias.

A noite dos mortos-vivos apresenta uma situação limite e sem precedentes para a humanidade: os mortos retornaram, muito diferentes de como eram em vida, e com um desejo irracional por carne humana. A causa para tais acontecimentos é desconhecida e a população vive em estado de emergência. Quando o livro tem início, todas as formas de comunicação nas áreas rurais dos Estados Unidos parecem não estar mais funcionando e as pessoas que vivem por ali precisam se virar como podem para sobreviver enquanto a ajuda das cidades maiores não chega.

Os acontecimentos do primeiro livro se concentram, quase que totalmente, em uma casa cercada por mortos-vivos. O leitor acompanha as tentativas de sobrevivência das pessoas que estão lá dentro, tanto em relação aos zumbis, quanto em relação a si mesmos.

Em A volta dos mortos-vivos, dez anos se passaram desde os acontecimentos do primeiro livro. Ainda sem saber a causa para o fenômeno, a humanidade enfrenta novamente os mortos que ressurgem, porém, já está preparada para lidar com a situação. Aqui, o perigo não fica por conta apenas dos zumbis, mas também de seres humanos que tiram proveito da situação para praticar atos de violência. Há também referências à religião, à fé e ao modo como a morte passa a ser encarada pelas pessoas.

Primeiramente, nunca gostei de histórias de zumbi. Não sei explicar o motivo disso, apenas não acho zumbis interessantes o suficiente, apesar de achá-los bastante assustadores. Assim, resolvi ler A noite dos mortos-vivos com o intuito de compreender a origem dos zumbis como os conhecemos hoje na cultura pop e também com a esperança de gostar um pouquinho deles.

Gostei bastante da forma como os livros tem início, com reflexões sobre a vida e a morte, antes de partir para os acontecimentos propriamente ditos.

Pense em todas as pessoas que já viveram e morreram e que nunca mais verão as árvores, a grama, ou o sol. Tudo parece tão breve, tão...inútil, não é? Viver um pouquinho e depois morrer? Tudo parece resultar em nada. Ainda assim, de certa forma, é fácil invejar os mortos. Eles estão além da vida, além da morte. Têm sorte de estarem mortos, de terem feito as pazes com a morte e não precisarem mais viver. Estão debaixo da terra, alheios...alheios ao sofrimento, alheios ao medo de morrer. Não precisam mais viver, nem morrer, nem sentir dor, nem conquistar nada. Ou saber qual é o próximo passo, e se perguntar como seria enfrentar a morte. (p. 17)

A primeira história tem início em um cemitério e achei a ambientação bastante satisfatória, pois me ajudou a entrar no clima dos acontecimentos e, ao mesmo tempo, me fez pensar em filmes antigos de terror. Bárbara, a primeira personagem que acompanhamos, se mostra bastante corajosa nas primeiras páginas, logo após sobreviver ao ataque de um morto-vivo, porém, assim que entra na casa e somos apresentados aos demais personagens, se torna a personagem mais chata de todo o livro. 

Pouco depois de a chatice de Bárbara começar, a narrativa começou a ficar arrastada e nada parecia acontecer. Durante páginas e mais páginas, lia apenas sobre como aquelas pessoas estavam começado a se detestar e a perder as esperanças de sobrevivência enquanto a casa era rodeada por zumbis. Mais para o final, a história começa a ter mais ação e o final é bastante surpreendente e, de certa forma, revoltante.

Já A volta dos mortos-vivos me interessou bem mais. Ao contrário da primeira história, que se concentra em um único local, aqui há movimentação. Os personagens saem de onde estão e tentam encontrar outros sobreviventes, chegar à cidades maiores. Há também momentos em que desconfiamos de alguns acontecimentos e de reviravoltas. Gostei de como o autor abordou o lado ruim da humanidade, que sempre vem à tona em situações limite, revelando monstros tão, ou até mais, assustadores que os zumbis. 

A narrativa em ambos os livros é feita em terceira pessoa e conta com os diálogos dos personagens. Há também trechos que são, na verdade, transmissões de rádio que funcionam para informar o leitor e os personagens sobre os acontecimentos nas regiões afetadas pelos mortos-vivos. É um recurso interessante pois ajuda na ambientação da história.

De uma forma geral, achei a leitura de A noite dos mortos-vivos/A volta dos mortos-vivos bem mediana, mas essa é a opinião de alguém que não se interessa por histórias de zumbi. Acredito que aqueles que se interessam por essas criaturas e/ou são fãs de The Walking Dead possam aproveitar melhor a experiência.

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A editora DarkSide lançou duas edições do livro, sendo uma delas bastante especial, de colecionador e capa dura. A minha é a mais simples, mas ainda assim, não deixa de ser bastante caprichada. O livro conta com as páginas amareladas, um bom tamanho de fonte e um espaçamento decente entre as linhas, de forma a não cansar a vista e/ou atrapalhar a leitura. Todas as páginas contam com detalhes na diagramação e algumas ainda trazem imagens do filme de 1968.